terça-feira, 13 de outubro de 2009

Partida

Quando fui embora, recolhi todos os desejos. Não te olhei nos olhos, não virei para trás, não te abracei pela última vez. Apenas decidi ir, como quem escolhe o caminho incerto, das dúvidas eternas, dos desencantos, das dores e da ausência de paixão.

Apenas levantei e disse que iria. Ainda tentastes tocar minhas mãos. Nossos dedos apenas se roçaram e por segundos senti todas as sensações passadas, todos nossos toques, percepções, nosso primeiro olhar e o momento único e indescrítivel do teu beijo.

Mas não olhei pra trás. Mesmo com os olhos repletos de dor, cravejados dos diamantes de nossos desejos, eu decidi partir. Cada passo na direção contrária, pesava-me incontáveis distâncias e quase tive que me arrastar, tamanha a força do mundo para que voltasse.

Mesmo assim, dei um passo de cada vez. E mesmo que a sensação seja de ter caminhado milhares quilômetros longe de ti, não poderei jamais olhar para trás.

Você está perto demais.

Raquel Duarte

Abstinência

Boca seca. Lábio quente. Lingua áspera.

Pele viva. A veia pulsa ainda que fraca...

Nos olhos, o lacrimejar constante. Na garganta, um choro preso, que arranha e engasga. Sufoca. 

Na visão, vultos. Sepulcros. Fantasmas que não quis. Tuas sombras se arrastam entre minhas pernas, me perceguem.

Teu cheiro me invade, não me deixam respirar... Mas você não está aqui.

Nas mãos, o teu toque. Na pele, teus sentidos. E no peito, um palpitar rarefeito, torturante, querendo desistir dos seus caminhos.

Ainda consigo suspirar. Quase em suplício uma palavra abre espaço entre os dentes já cerrados...

"Volta"

 e o peito arde feito corte seco de navalha.


por Raquel Duarte

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Dias prateados



Gotas colam nas calçadas, poças lambem os pés descalços dos transeuntes. O frio gélido deixa a primavera ainda mais densa. O vento sopra meus cabelos,  que atrevido,  passeia entre meus seios e provoca arrepios - acalenta desejos, tantos, que os deixo transbordar num discreto sorriso.

Nas ruas o brilho úmido do asfalto - as mesmas ruas pelas quais nos confessamos um dia. Nelas, quase posso ver você. Sinto sua presença ao meu lado, em cada passo das minhas botas negras que esmagam as poças de chuva. A imagem do seu sorriso ainda me inquieta. Outras vezes é exatamente ela que ilumina meus pensamentos. Eu sei, é estranho.

Ao mesmo tempo percebo que não é mais tão fácil olhar pra você. Olhar nos teus olhos, no fundo dos teus olhos e pousar os meus olhos nos teus. Não é mais tão simples.

Quando neles mergulho, me deixo perder. Tudo some. Foge a frase, perco o ritmo e então sem rumo, sorrio.

Se existe um recurso, uma fuga, um remédio, uma cura...é o sorriso.

Assim, recolho meus pensamentos um a um. E me pergunto em segredo, o quanto você sabe de mim.

Mas retorno para o meu mundo, a rua, o meu caminhar de volta pra casa.

Sinto prata meu coração,

tão gélido como uma lâmina e tão pronto como um vulcão.



Raquel Duarte

Dias Prateados II (Viagem)

Num dia prata,

Pegue em minhas mãos e me leve para o lugar mais alto, mais quieto e mais frio que puder encontrar.

Lá, em pé, sentiremos o vento açoitar nossos rostos, transformando-os em retratos gélidos de nós mesmos, sem o sorriso dos dias comuns.

E lá, bem no topo do mundo, esqueça um pouco de quem somos e onde estamos. O que buscamos ou o que perdemos. Esqueça das angústias e dos romances imperfeitos.

E fique assim, em silêncio. Deixe apenas o vento congelar o corpo inteiro para enfim se deixar aquecer, lentamente, apenas com o enlace de nossas almas, libertas.

Raquel Duarte

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Portas


Portas sujas
Portas abandonadas
Portas esquecidas
Portas maltratadas
Portas incertas
Portas abertas
Portas insanas
Portas tristes
Portas claras
Portas belas
Portas raras
Portas negras
Portas cinzas
Portas pelegas
Portas lânguidas
Portas insóluveis
Portas problemáticas
Portas fechadas
Portas enigmáticas
Mas quem se importa?

Raquel Duarte

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Simples

O beijo é ópio
Beijo é pó
Beijo é laço
Beijo é nó
Beije-me apenas
E será beijo só


Raquel Duarte
set 09

Viagem

Um beijo é só um beijo
E também pode ser uma porta
Um caminho
Um destino
Para entender sua simplicidade
Basta colocar a mochila nas costas
e seguir.

Questionamentos

Ainda sou pequena para entender, como e porque, alguém que se diz livre para viver um grande amor, não se permite a entrega de um beijo.

RD set 09

Vaze

Essa dor
que quer gritar
diz que só quer passar.

Não entenda
Não limite
Apenas respeite

Saia da frente
e a veja partir
Mas antes do fim
a permita
existir

Raquel Duarte set 2009

Oculta



Certas dores não passam
Arrebentam
Quebram repentinas
feito ondas revoltas

martirizando as pedras
que úmidas
visçosas e tristes
permanecem inertes e firmes
e ninguém percebe
que choram

Raquel Duarte - set 2009

domingo, 23 de agosto de 2009

Minh´alma




Persigo teus olhos
Pressinto seus cheiros
Percebo meus dramas

Pretendo segredos
Proíbo contatos
Provoco a chama

Passível entrego
Paixão e medos
Perco os sentidos

Plena de mim
Perdida em você
Permaneço


Raquel Duarte
22/08/09

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Em mim

Ainda está em mim...

....tua presença, que me remeteu ao reconhecimento de almas... teu olhar que penetrou meus olhos feito a luz do sol... tua boca, que revelou um sorriso único...O teu gosto, que foi entregue com o sabor que eu já adivinhava, mesmo quando nossos sonhos pareciam insolúveis.

Mesmo assim, não sei dizer oque é verdade. Ou oque é permanece feito sonho. Se apenas estou insone, ou embriagada de ti. Embriagada deste desejo cretino que se agarrou em mim feito inseto. Cretino por que ao mesmo tempo (que arde) acaricia suavemente a alma, feito o movimento das asas das borboletas. Tú borboletas em mim, agarrado, com fúria e ânsia de vingar-se de tantas promessas.

Ainda assim, estás em mim. Seria fácil ir embora agora e decidir que o fim seria o melhor dos começos. Mas não quereremos ser fáceis. Queremos (sinto), esparramar o gosto disto que vivemos, com as mãos lambuzadas e assumidas de verdades tangíveis. Desistimos daquelas das ilusões das palavras, para acreditar que é possível. Sei que queres descobrir-te além das fantasias imortais.

Deixa-me ser simples. Sorrir um pouco e desviar os olhos dos seus, quando for preciso. Deixa-me te chamar e dizer destas bobagens que dizemos só para nos sentirmos próximos, vez ou outra. Deixa acontecer, mesmo que não entendamos direito os merecimentos e justificativas. Deixa, sentirmos tudo isso e mais um pouco . Em mim e em você. Deliciosamente únicos em nosso mistério.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Miragem

Desta vez, não pensei. Me entreguei as palavras. Mergulhei nos pensamentos insensatos e repleto de delícias as quais você me remete. Quis calar em mim, algo que reservei durante tempos. Inútil. Rasgou em mim como um ritual de renascimento. E de uma longa espera do novo. Do eclodir de um novo eu. Sem medos.

Pensei... se ao menos pudesse dar um passo a mais. Lentamente, indo. Lânguida. Trêmula. Incerta. Mas indo.Quando me entreguei as palavras, não tive controle. Só existia o ímpeto. Uma doce ilusão que teria você, naquele instante. Quebraríamos amarras. Voaríamos livres para dentro um do outro. Cerceando nossas incertezas. Descartando velhas hipóteses. O certo e o errado. O bom e o mau. O pecaminoso e o puro.Nada é mais puro e verdadeiro do que ouvir-te.

Quando sussurras, me grita. Sinto tua voz rasgar meus limites. Preciso saciar minha sede de saber o teu gosto. Desvendar seu mistério. Quero te descobrir como quem lê um livro. Página à página, tocando cada linha com os dedos e me permitindo todas as sensações possíveis. Quero também ler-te a alma, que se descortina pouco a pouco diante dos meus olhos. Então, venha, deita no meu colo e me diz (finalmente) porque estamos aqui.